domingo, 19 de agosto de 2012

O cheiro do livro


Entre dois sábados foi o tempo em que vivi um dos capítulos mais tocantes da minha vida. Entre duas feiras literárias foi o espaço em que se desenvolveu essa história. Uma delas, a Bienal Internacional do Livro de São Paulo. A outra, a Feira Literária de Caraguatatuba (FLIC).
            Creio que todos já conhecem a Bienal, um grande evento na maior cidade do Brasil. A outra é uma feira literária em sua segunda edição, um evento que muitos considerariam ainda pequeno, realizado em uma cidade não tão grande quanto a capital paulista. O que elas têm em comum?
            Recentemente, escrevi um texto sobre a minha visita à Bienal do Livro e tive a felicidade de vê-lo publicado no informativo, distribuído durante o evento. A CBL, a Reed e a Viveiros fizeram a gentileza de me enviar uma cópia em pdf, anexada ao meu email. Abri o arquivo. Fiquei emocionado, mas... faltava alguma coisa. Para explicar o que faltava, vamos à FLIC.
            Enquanto acontecia a Bienal em São Paulo, acontecia também a FLIC em Caraguatatuba. No impresso do evento, estavam anunciados os escritores convidados. Eu e “um tal” de Ignácio de Loyola Brandão. Vocês imaginam o que é ver o seu nome impresso abaixo do de Ignácio? Quando fui conhecê-lo, entreguei-lhe o meu livro, dizendo, meio constrangido e pejorativamente, que era apenas um livrinho. Ignácio disse: “Nunca diga isso! Livrinho eu não quero” Logo em seguida... cheirou. Cheirou o livro com prazer. E disse: “Eu gosto do cheiro do livro”.




            Pois bem, duas coisas eu aprendi naquele momento. Uma é o que faltava em meu texto publicado. Faltava o cheiro do papel impresso, a sensação de carinho, do toque. Por isso, logo após a final da FLIC, voltei à Bienal para tentar encontrar o informativo publicado há três dias. Queria cheirar as minhas palavras!
            Ao chegar à recepção, o segurança me cumprimentou com um sorriso. Eu estava com um livro na mão. Ele me perguntou sobre a obra. Conversamos sobre livros. Logo após, me conduziu às moças da recepção. Expliquei a elas o meu intento. Gentilmente, uma delas se dispôs a procurar o impresso. Após um tempo, eis que ela vem com um papel amassado. Lá estava o meu texto. Ela me disse assim: “Que pena que está amassado”. Respondi: “Muito obrigado! Não me importa de estar amassado. Estou feliz de estar aqui”, disse apontando para o papel impresso.
            Pois bem. Não me importo de estar amassado entre milhares de pessoas, enfrentando filas imensas na Bienal. Estou feliz ali, entre palavras e sentimentos. Muitas pessoas reclamam de serem amassadas, porque estão assim por uma outra razão. Amassam-se correndo atrás apenas de dinheiro, rasgando as pessoas pelo caminho. Aí vem a outra coisa que Ignácio me ensinou.
            Os responsáveis pela FLIC me contaram, com tristeza, que neste ano, os livreiros e as editoras que haviam participado no ano anterior não quiseram participar, porque no mesmo momento estava acontecendo a Bienal do Livro em São Paulo. Evento pequeno. Evento grande. Não existe isso. Tudo é um grande evento na vida, quando realizado com o coração.
Durante o grande evento da FLIC, conheci uma família vendendo livros: um pai (Clodoaldo) e três filhos (Cristiano, Évelin e Felipe). Os organizadores estavam felizes por terem encontrado alguém para vender livros na feira, apesar de este não ser o foco principal. O principal era difundir o amor pelos livros. E isso foi feito por essa família livreira. Em dois velhos carros, amassados entre livros, eles seguiam viajando, vendendo obras literárias. Vi livros sendo vendidos a 50 centavos. Perguntei: “Isso dá lucro?” Resposta: “Não. Mas esses aí são só para quem não tem muito dinheiro, para que eles possam ter a alegria de comprar um livro também”. A alegria de poder ter um livro...

Família Freitas: unida pela paixão pelos livros.

            Durante a FLIC, vi essa alegria muitas vezes. Crianças que me amassavam com abraços após a minha palestra, pedindo autógrafos até em seus braços, folheando o livro do meu coração. Pessoas trabalhando com amor pelos livros: professores, alunos, estagiários, pessoal de apoio, atores, contadores de histórias, artistas, estagiários, livreiros... Famílias. Pessoas se amassando em abraços durante a FLIC. Pessoas que plantaram uma muda de pau-brasil ao final da feira literária, que juntas irão crescer. Pessoas que sabem que um grande evento não se faz com a quantidade de pessoas, mas com a qualidade delas. Qualidade que, felizmente, ainda encontrei na Bienal.
Enfim, um livro “grande” ou “pequeno”, seja como for, ambos possuem o mesmo cheiro quando escritos, feitos, comercializados e lidos com amor: o cheiro de vida.

2 comentários:

André Foltran disse...

Emocionante as lições que tira de suas andanças literárias... Parabéns!

Grande abraço,
André

André disse...

Obrigado, André. Um grande abraço!