quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Onde estão as palavras?

Ao olhar para as crianças em silêncio sentadas diante de mim, esperando pelas minhas palavras, pensei: onde estão as minhas palavras?




Durante a Feira Literária de Caraguatatuba, diante de crianças de nove anos, fiquei calado por alguns instantes. Estava ali para dar uma palestra sobre literatura, mas tudo o que havia em minha mente era o rosto de um menino chamado Hikaru. Um rosto que eu procurava entre os rostos daquelas crianças. Pensava em como ele estaria ali "não" prestando atenção na minha palestra, levantando-se, conversando (como ele gostava de conversar!), brincando, tudo, menos parado ali, me escutando.
Foi então que parei de dar palavras que não estavam mais comigo, e falei sobre o que estava em meu coração: o silêncio de Hikaru.
Quando falei de como levei o menino para ver o pôr-do-sol, em sua cadeira de rodas, as crianças choraram. Sim, crianças gostam do pôr-do-sol. E eu pensava em como deve ter sido aquele pôr-do-sol para ele, antes que a luz fosse apagada (por um momento aqui na Terra, tudo ficou escuro).

_ Mamãe, por que você apagou a luz?
A mãe chorou, ela não havia apagado luz alguma...

Logo após a minha última palestra na FLIC, peguei a estrada e percorri centenas de quilômetros para a missa em memória a este menino, que partiu com apenas nove anos. 
Passei uma semana em Guatapará, conversando com as pessoas que o conheceram. E foram tantas. Todas elas disseram o quanto ele era (e é) especial. Na câmara municipal da cidade, foi proposto dar o nome de uma creche ao menino, tão querido ele era. Um homem com câncer, o mesmo câncer que levou o menino, pediu baixinho durante uma noite de dor, força ao menino. O padre disse que ele era um santinho (e todos que o conheciam disseram que ele era o mais arteiro dos meninos... um anjo arteiro?)...
E eu perdi todas as palavras que me restavam quando vi as lágrimas da mãe desse menino, a minha prima, do pai, dos meus tios, de todos os que conheceram o menino... para onde minhas palavras teriam ido? Conversar com ele em algum lugar? Que lugar?
Há sete anos, eu peguei uma criança de apenas dois anos em meu colo. Foi a primeira vez que eu me dei conta de como era brilhante aquele sorriso... que o acompanhou até o último instante. Mesmo com dor, o menino sorria. Algo que eu não consigo explicar. Como sorrir com dor? Só havia amor naquele sorriso.
Isso havia sido logo após a minha viagem que inspirou o livro "Além do Horizonte". Onde está essa criança agora? Além do horizonte também?

Palavras, por favor, voltem para mim, para que eu possa contar a história de um menino que inspirou não apenas a sua família, mas a todos que o conheceram... e foram tantos... e deveriam ter sido muito mais, pois o sorriso desse menino... Isso nunca, nunca deveria se apagar. 

Sonho com o livro de Hikaru, que em japonês significa: brilho, luz...

Ele ainda brilha entre nós...