sábado, 30 de junho de 2012

É possivel?

Vivo a vida que quero. Trabalho como escritor. Não riam! Um trabalho, dizem, é aquilo que te sustenta financeiramente. Ué, eu pago minhas despesas com poesia. Agora não conseguiram segurar a risada? Sim, escrevo poesia, ganho uma grana em algum concurso de poesia. Escrevo um conto, ganho mais alguns "contos" em outro concurso literário. Assim vou arrecadando o dinheiro necessário para viver sem ter que ser “pior do que um mendigo” (como um dia meu pai me disse que eu era) isto é, deixar que as pessoas que me amam paguem pela minha sobrevivência (ele estava certo).
Aliás, uma coisa que me ajuda muito a viver assim é o fato de viver sem contas pra pagar. Isso mesmo, não tenho contas a pagar. A isso, agradeço ao Fernando, tataraneto do barão de Mauá, que gentilmente me cedeu um quarto, em uma parte desativada de um asilo de sua propriedade. Generosamente, ele me disse que eu poderia ficar por lá, sem pagar conta alguma, sequer de água e luz, até quando eu me mudasse para o “andar de cima”. Não, isso não foi um eufemismo. O andar de cima é um asilo em plena atividade. Moro no andar inferior. Com uma vista "superior" para as árvores e vários macaquinhos.
Como conheci o tataraneto do Barão? Quando fui procurar um lugar para abrigar cinquenta tailandeses. O grupo em questão me convidou para morar com eles. Por seis meses, morei e convivi com esse povo incrível em uma chácara alugada do tataraneto do Barão, também sem pagar contas e ainda ganhando algum dinheiro como intérprete. Eu os conheci no aeroporto...
Minha vida é assim, cheia de surpresas, desde o dia em que decidi viver a vida como eu a queria, e não como as pessoas esperavam que eu a vivesse. Isso foi no ano de 2003.
Após trabalhar duro no Japão, em turnos de até 15 horas por dia, consegui juntar dinheiro para pagar por um mestrado na Austrália. Mas, enquanto estudava na University of Sydney, percebi uma coisa curiosa. Por que fui trabalhar no Japão e por que fui estudar na Austrália?
 Ora, no fundo, eu só queria viajar, conhecer novas culturas, viver para poder contar boas histórias, ser escritor. Então, por que estava estudando Marketing? Para conseguir um bom emprego para ganhar bastante dinheiro para comprar uma boa casa e um bom carro para logo depois pagar o IPTU e o IPVA desses bens e comprar mais bens “essenciais” para ganhar mais contas para pagar. Tudo isso sem vírgula mesmo, sem pausa. Ora, isso é a vida que eu não queria. O que eu queria? Queria viajar e escrever sobre minhas viagens. Queria morar no mundo e só pegar carona em todos os carros. Simples assim.
Eu tinha 27 anos quando decidi isso. Juro que não sabia que nessa idade Jim Morrison, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Brian Jones, Kurt Cobain, Amy Winehouse (essa eu não poderia saber mesmo, só se fosse vidente) morreram com essa idade. Creio que é uma idade crítica, a idade em que os jovens sonhos envelhecem em um único segundo. Enfim, ao invés de morrer ou deixar o meu sonho morrer, preferi viajar, como escrevi na orelha do meu primeiro livro: “Uma viagem sem destino é um suicídio sem morte”.
Melhor do que morrer de verdade, não acham? Assim, viajei. Decidi deixar a Austrália e voltar para casa pelo caminho mais longo, passando por 50 países. Oito meses depois, tranquei-me em um quarto na casa de minha querida irmã por um ano. Por um ano, só escrevi. Vi que escrever não era tão fácil assim. Em uma grande fogueira, desistia de escrever. Para logo a vontade renascer como uma fênix.
Era preciso viajar de novo, não para buscar coisas para escrever, mas apenas para viver. Na minha primeira viagem, preocupei-me demais com os lugares, as sete maravilhas do mundo, esquecendo-me de que quem construiu as maravilhas foi o ser humano. Isso, as pessoas! Saí em busca delas, para, quem sabe, me encontrar entre elas. Botei o pé na estrada de novo. Desta vez, torrei tudo na estrada e continuei viajando, sem grana. Dormi entre mendigos e malucos, nas ruas e nas matas, peguei carona, andei centenas de quilômetros... Voltei para casa e escrevi o meu primeiro livro: “Além do Horizonte”.
Por insegurança, não tive coragem de mandar para as editoras. Mandei para apenas uma e não recebi resposta. Pronto, mais uma vez achava que seria isso, o fim antes do começo. Então, meu padrasto me disse, entregando um envelope com dinheiro, parte de uma herança dividida entre 9 irmãos: “Para o seu livro”.
Olhando para o envelope, lembrei-me das palavras do meu grande amigo, Felipe, que sempre acreditou mais em mim do que eu jamais poderia acreditar. Ele dizia que era inútil as outras pessoas acreditarem em mim se eu mesmo não acreditava. Lembrei-me das palavras do pai dele, durante o funeral de seu filho, meu amigo Felipe: Escreva um livro pra ele. Peguei a grana. Paguei para publicar o livro, dedicado a ele, e lançá-lo, no dia de seu aniversário. 
Agora, vinha o trabalho. Carreguei livros para vendê-los. Debaixo de chuva, carreguei a sinopse do livro para divulgá-lo. Sucesso de vendas entre amigos. Fracasso nas cidades desconhecidas. Carreguei mais livros e, quanto menos vendia, mais pesado eles ficavam. Quem disse que escritor não sua?
Veio o segundo livro, Amor sem Fronteiras, também pago. Com ele, veio a primeira premiação, pela União Brasileira de Escritores,  realizada no Teatro da Academia Brasileira de Letras. Porém, o maior prêmio deste livro foi tê-lo lançado no dia do aniversário de minha musa, Patrícia. Nunca esquecerei o seu sorriso, após entrar na fila para pegar um autógrafo. Disse a ela que o seu livro tinha um marcador de página especial, que marcaria a história de nossas vidas. Quando ela puxou o marcador, encontrou a aliança...
Veio o terceiro livro, Contos do Sol Nascente, agora, pago pelo Governo do Estado de São Paulo. Vendi mil livros, arrecadei dez mil reais. Doei cada centavo para entidades beneficentes. Isso porque, muito melhor do que receber é dar, com amor. Uma forma de agradecimento por tudo o que tenho recebido durante estes anos dedicados à literatura. O livro recebeu três prêmios literários... e o sorriso de meus pais.
Veio o quarto livro, Cem pequenas poesias do dia-a-dia e, com ela o maior prêmio que um escritor como eu poderia receber. A publicação de sua poética obra premiada na ocasião e uma viagem. Foi durante a cerimônia de premiação, realizado no Teatro Celina Queiroz, na Universidade de Fortaleza, que contei um pouco do que aqui está escrito para o público presente. Após falar, o que imaginei ser um monte de besteiras, recebi vários comentários, de pessoas que me agradeceram... dizendo que eu era um exemplo de que sonhos são possíveis.
Sim, há alguns anos, sonhava em ser escritor. Hoje sou. Talvez não seja um escritor consagrado, mas sou escritor. Vivo de minha escrita, com alegria.
Por isso, gostaria de dizer que se vocês têm um sonho lutem por ele. Mas devo alertá-los, se não tiverem a capacidade de fazer algum sacrifício pelos seus sonhos, nem tentem correr atrás deles. Será perda de tempo.
Já passei fome, solidão, dormi na chuva, mas sempre imaginei o quanto isso seria bom no final, porque sabia que isso daria uma boa história para contar. Já carreguei cem livros nas costas para vender apenas um. Já pensei que não ia dar certo e superei. Já ouvi muitos "não" e pessoas me dizendo que o que eu fazia não era trabalho, que era hora de trabalhar de verdade e deixar de ser vagabundo. Já riram de mim... Mas, agora, eu rio, não deles, mas para mim.
Também, se não tiverem a capacidade de abrir mão do superficial para irem atrás de seus sonhos, não abram, permaneçam na superfície das coisas. Isso não é errado, se isso traz alegria profunda. Para mim, bens materiais não me iludem. Eu não ligo quando tenho que ir aos locais a pé, por não ter carro. E sinto orgulho de andar na garupa da moto da minha mulher, quando temos que ir a um lugar mais distante. Ouvi de alguns amigos (dois muito próximos) que teriam vergonha de ir na garupa de uma mulher. Acho besteira, por que isso? Quem não ficaria orgulhoso de seguir uma grande mulher?
Não tenho casa, moro em um quarto, em um asilo afastado. Cozinho coisas simples em um fogareiro elétrico. Lavo a louça na mesma pia do banheiro e lavo a roupa em uma bacia debaixo do chuveiro.
Há anos não compro sequer uma peça de roupa para mim. Tudo é presente que recebo de pessoas queridas, em meu aniversário, no Natal e em qualquer outra data especial ou não. Não ligo para marcas ou estilos, visto o que ganho e posso dizer que estou vestido com a melhor grife do mundo. Estou vestido com a marca do amor.
Minha família me dá o apoio que preciso para caminhar. Retribuo quando posso, não porque é preciso, mas porque isso me traz uma alegria muito grande. Por exemplo, com o dinheiro de meu primeiro prêmio literário, tive a felicidade de poder comprar uma viagem para minha mãe e meu padrasto. 
Meus amigos me dão amizade sincera (o que um cara como eu pode dar a eles, se fosse um caso de amizade interesseira?)
Minha esposa me dá a maior prova do amor verdadeiro: a liberdade. Ela me faz acreditar ainda mais que sonhos são possíveis. Ela me apoia e eu a apoio. Juntamos os nossos sonhos e assim os realizamos juntos.
Meus amigos e amigas , se vocês estiverem prontos para isso tudo, viver o amor "que ninguém vê" e relevar as coisas supérfluas da aparência, aí sim, estarão prontos para viver um sonho. Talvez, tudo isso que estou dizendo seja apenas uma grande besteira. Mas é uma besteira com a qual sonhei e realizei. Não estou aqui para dizer que o que vocês estão fazendo é errado. Estou aqui para dizer que o que eu fiz foi certo, para mim. Cada um tem o seu sonho e a opção de vivê-lo ou não.
Eu vivo o meu. Torço para que todos vivam os seus sonhos. Ou melhor, que sejam felizes com as suas realidades, frutos de um sonho realizado ou não.

Felicidades e muito obrigado a todos que tornam possível a realização de meus sonhos!

Um grande abraço!

André Kondo


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Aos amigos da CL, muito obrigado!