Em uma semana, participei de vários eventos literários em três cidades: Jundiaí, Pindamonhangaba e Maringá...
Participando
da Festa Literária de Maringá, minha primeira palestra foi sobre “O processo
criativo”. Foi um assunto leve, assim como é o ato da criação literária. No dia
seguinte, falei sobre a “Produção literária”. Foi então que o assunto se tornou
denso. Afinal, comparei o ato da criação literária ao amor, ao êxtase.
E o que seria a produção literária? Seria o parto e suas dores, seria carregar
um filho pelo mundo até que ele fosse capaz de caminhar por si só. Portanto, seria fácil escrever, difícil seria dar vida ao texto em uma publicação.
Tomei
por base a minha experiência pessoal, as dificuldades da primeira edição, as frustrações de tentar vender os meus primeiros livros. Por muitas vezes,
sentimos vergonha de vender aquilo que produzimos. Por outras, achamos até
incorreto, afinal, quem vende um filho? Falo isso no caso da autopublicação,
que nada mais é do que pagar para ser publicado. Aí, falei do peso do sonho.
Para
a minha palestra em Pindamonhangaba, saí de casa às quatro da manhã, carregando
200 livros. O carrinho com os exemplares quebrou já no atravessar da primeira avenida, antes de
tomar o meu primeiro de três ônibus urbanos e dois intermunicipais, em uma
viagem de cinco horas. Eis o peso do sonho: carregar o peso de 200 livros como
se carrega um bebê.
Quando
falei sobre isso, queria que as pessoas tivessem a consciência de que não é
fácil realizar um sonho. Que é preciso esforço. Em meu último evento na FLIM, uma mesa
literária com o grande escritor Roberto Torero, uma fila se formou ao final,
com leitores esperando por um autógrafo dele. É essa a imagem que muitos
sonhadores têm de um escritor. Mas não é sempre assim. A realidade da maioria
dos escritores é uma mesa repleta de livros, mas quase ninguém para comprá-los.
Em meu primeiro evento de lançamento, vendi 108 livros e fiquei exultante. Sucesso! Só
depois é que percebi que destes 108 livros, apenas um havia sido vendido a uma
pessoa que eu não conhecia. Cento e sete livros foram vendidos para familiares
e amigos. Por outro lado, ao realizar o lançamento do mesmo livro em uma cidade
na qual não tinha família ou amigos, vendi apenas dois exemplares. E os dois
foram vendidos a um amigo que, por acaso, estava lá.
Expus
em minha palestra que se alguém tinha o sonho de ser escritor, que ele deveria
estar preparado para suar, para carregar livros, para não se abater com o
fracasso de vendas inicial, para não ter vergonha de vender o seu livro. De
acreditar nele. Critiquei as antologias cooperativadas de concursos literários
que premiam o autor com o direito de pagar algumas centenas de reais para ter uma
ou duas páginas no livro. Acabei sendo duro com autores que pagam para serem
publicados, assim como eu havia feito no passado.
Foi
então que, ao final da palestra, a escritora Jeanette De Cnop me fez uma
pergunta que me fez refletir: “Mas será que você não está levando muito a ferro
e fogo?”...
Sim,
eu estava. Ela disse que um escritor pode escrever e trabalhar com outra coisa
também. Eu estava até sendo arrogante, pois mesmo inconscientemente, eu me incluía
no grupo que vê a vida de um escritor apenas como a de alguém como o Torero,
vencedor do Jabuti. Então, escritor seria apenas aquele que vive do que recebe
com sua escrita? Será que ser escritor é isso? A opção de viver exclusivamente da
minha escrita era minha, e com ela, todas as privações ligadas a esta escolha,
como viver frugalmente, pois os ganhos são escassos.
Durante
a FLIM, vi escritores maravilhosos, que batalhavam a venda de seus livros.
Quando comprei um livro da escritora Eliana Jimenez, ela não queria pegar o meu
dinheiro. E só se sentiu melhor quando comprou um livro meu. E assim comprei
livros das escritoras Marilza Conceição e Adriana Zanetta, que compraram os
meus também. Comprei algumas coletâneas da Academia de Letras de Maringá, e a
Sumiko, esposa do acadêmico Jaime Vieira estendeu o dinheiro para que eu não
tirasse um centavo do meu bolso! Aí, dei um livro meu de presente a ela.
Depois, a coisa foi para o escambo mesmo, e troquei livros com os escritores
Benevides Garcia, Carlos Brunno e a família Rogério (um livro de poesia
coletivo, feito por uma família!). Além de escritores, eles eram professores,
advogados ou aposentados, que duramente trabalharam por toda a vida nos mais diversos ofícios. Escreviam não por dinheiro, mas por algo maior. Por
fim, após dar um livro meu para o Torero, até ele gentilmente me deu um livro
dele de presente. Aliás, Torero ainda é jornalista, roteirista e cineasta.
Minha
palestra foi dura. Sei que às vezes é preciso ouvir certas coisas, mas aquele
não era o momento. Nem todos ali queriam ser escritores que vivem
exclusivamente da escrita, como eu. Muitos só queriam escrever. E aí é que me
toquei. Produção literária não é publicação e impressão de livro. Errei feio.
Produção literária é escrever belos textos e não a produção de um produto para
venda. Aos participantes, peço desculpas pelo meu grande equívoco.
Voltando
ao peso dos meus livros carregados para a ETEC de Pindamonhangaba, todos os
exemplares foram comprados pelos alunos, professores e funcionários, sendo o
dinheiro arrecadado integralmente destinado ao GRENDACC (Grupo em Defesa da
Criança com Câncer). Os livros eram da primeira tiragem, que havia sido
financiada pela Secretaria de Cultura de Jundiaí, em um projeto parcialmente
destinado para isso. Então, não ganhei nada com aquela venda? Ganhei sim,
imensamente. Afinal, quando fazemos nosso trabalho com amor, recebemos amor.
Fui lindamente recebido por todos da escola, sentindo um carinho que fez com
que todo o peso do mundo não significasse nada. Eis a leveza do sonho
realizado. E assim também foi em minha palestra durante a Semana de Cultura e
Línguas Estrangeiras, promovida pelo Centro Municipal de Línguas em Jundiaí,
quando além do carinho, ganhei uma caneca de presente, na qual sorvo um
revigorante chocolate enquanto escrevo este relato.
Assim
como há médicos que são voluntários por um período e nada ganham, por amor à
medicina... Assim como há pessoas que doam um pouco do seu trabalho e nada
recebem por suas causas beneficentes, assim também podem ser os escritores, que
não precisam apenas de dinheiro para executarem o seu ofício literário. Afinal, ser escritor não é aquele que vive com o que ganha pela sua escrita, como eu pensava. O dinheiro pode vir da
venda dos livros ou de qualquer outra coisa. Enfim, aprendi que ser escritor não é viver
de literatura, mas viver por amor a ela.
Como escreveu o grande A. A. de
Assis, Patrono da FLIM:
“Tem muito mais graça a vida
quando a gente tem com quem
repartir bem repartida
a graça que a vida tem”.
Muito obrigado a todos da Escola ETEC
João Gomes de Araújo, do Centro de Línguas Antonio Houaiss, da Secretaria de
Cultura e Prefeitura de Maringá, da Academia de Letras de Maringá, enfim,
obrigado a todos pelo carinho! Encontros como esses desta semana é que fazem valer a pena a vida de um escritor.