sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Sonhando com o céu

Há quatro anos eu vivia um dilema. Continuar o meu sonho ou deixá-lo para trás para viver a realidade? Não seria um dilema, se a realidade fosse ruim, pois isso me faria lutar pelo meu sonho, para tentar viver uma vida melhor. O fato era que a realidade era boa. Afinal, eu havia encontrado a mulher da minha vida e com ela vivia, modestamente, em uma alugada casinha de fundos. Vivia feliz. Porém, quem pagava o aluguel? Ela. Pude pagar apenas uma única vez... O que me incomodava era que eu estava voltando a uma situação terrível: deixar o peso do meu sonho nas costas das pessoas que eu mais amava. Não era justo. Via minha esposa trabalhar com grande dificuldade, e sem reclamar, para manter a nossa realidade feliz. Se ela não tivesse que trabalhar tanto, não me importaria, o meu sonho não seria um peso. Além do mais, o trabalho doméstico é tão digno quanto o trabalho fora de casa. Afinal, admiro muito minha mãe, o trabalho dela, de cuidar dos filhos em casa, se chamava simplesmente amor. 
Antes de morar com minha musa, eu morava em uma sala de aula de uma escola de inglês de um amigo, que ainda me dava uma grana por ajudá-lo nas aulas, recepção, limpeza, etc. Escrevia minha primeira obra no longo intervalo entre as poucas aulas que eu dava. Mesmo assim, não consegui publicar meu primeiro livro (não tentei o suficiente) e apenas o fiz por presente de meu padrasto, em 2008. Aceitei, pois o livro era dedicado postumamente ao meu grande amigo Felipe e lançado no dia do seu aniversário. Lancei outro em 2009, dedicado à minha musa. Queria devolver o dinheiro, apesar da recusa do meu padrasto em aceitar. Com insistência, consegui devolver apenas 6 mil reais dos 8 mil que foram pagos para publicar os dois livros (e ainda cometeria o erro de empenhar mais 8 mil para mais duas publicações!) A minha literatura estava dando um grande prejuízo... 
Enfim, mudei-me para Jundiaí em 2009, quando passei a morar com minha musa. Escrevia dia e noite, mas escrever não pagava contas. Foi então que fiz uma promessa: "Se não ganhar dinheiro com minha escrita até o final do ano, desisto do meu sonho de viver de literatura". Em meados daquele ano, a professora Neizy Cardoso, à época diretora da Biblioteca Prof. Nelson Foot, entregou-me um panfleto da 5ª Olimpíada de Redação. Ela me incentivou: "escrever é fácil, e você ainda pode ganhar prêmios em dinheiro". As palavras finais do tema não poderiam ser mais propícias: "Ano Internacional da Astronomia: Descobre teu Universo". Será que eu descobriria o meu? Sim, escrever era fácil, difícil era ganhar dinheiro com a escrita...
Comecei a participar de vários concursos literários, divulgados na comunidade CL do Orkut. Muitos com prêmios em dinheiro! Cheguei a conquistar o segundo lugar no tradicional "Prêmio João-de-Barro". Se tivesse ficado em primeiro, ganharia 16 mil reais... Não ganhei. Fiquei em segundo lugar no belo "Prêmio UFF de Literatura". Dinheiro? Nenhum. Apenas a alegria de ter o trabalho reconhecido. O ano estava acabando e eu ainda não tinha ganhado um centavo com a escrita...
Minha última chance estava no prêmio da Olimpíada de Redação. Os doze premiados da minha categoria foram sendo chamados. Apenas os três primeiros ganhavam prêmios em dinheiro; e eu que desejava tanto que todos os doze fossem premiados com dinheiro! Dependia disso o meu futuro. Rezei, pedi fervorosamente a Deus para que eu ficasse em terceiro! O quarto colocado... não era eu. O terceiro... não...  Não podia culpar Deus pelo meu fracasso. Foi um balde de água fria. Meu coração já não aguentava mais e quando o segundo colocado foi chamado... levantei-me! Não, eu não era o segundo, estava abandonando o amplo auditório, resignado, dirigindo-me à porta de saída. Não suportaria ouvir outro nome que não o meu. Já antevendo esta situação, quis ir sozinho, não queria que me vissem triste. Quando já estava próximo da porta, de costas para o palco, ouvi o meu nome ecoando pelo salão...
E ninguém da plateia poderia imaginar que as lágrimas e o sorriso eram muito mais do que a conquista de um primeiro lugar. Se tivesse ficado em terceiro, como eu havia desejado, a reação teria sido a mesma. O que importava era ganhar qualquer quantia em dinheiro, porque eu não poderia quebrar a minha promessa! Aquilo era muito mais do que uma vitória. Era a descoberta do meu universo! O título da minha redação era "Sonhando com o céu". O meu sonho era o céu literário! Ficção? Terminava assim meu relato: "é possível afirmar que se o homem não tivesse sonhado com o céu, nunca teria chegado tão longe... aqui na Terra". Ganhei dois mil reais. 
Hoje, vivo da escrita. E não há homem mais feliz ao pagar uma conta! 


***

Por que escrevo isso hoje? Quatro anos após aquele dilema, eu vivia outro: para qual premiação literária ir? 
Um ano após receber meu primeiro dinheiro com a escrita, em 2010, meu segundo livro era um dos premiados na categoria crônicas, recebendo o Prêmio Paulo Mendes Campos, da conceituada União Brasileira dos Escritores no Rio de Janeiro, em uma cerimônia a ser realizada na Academia Brasileira de Letras! O meu primeiro livro a receber um prêmio! Por isso, uma premiação muito querida por mim.
Pois bem, dia 25 de outubro de 2013: ir à cerimônia da 9ª Olimpíada de Redação em Jundiaí, em que eu sequer sabia se seria ou não premiado, ou a outra cerimônia da UBE-RJ na Academia Brasileira de Letras no Rio de Janeiro, para receber dois prêmios: Prêmio Ganymédes José (literatura infantil) e Prêmio Humberto de Campos (categoria livro de contos)? 
Não parece um grande dilema, já que era certo que eu era um dos vencedores na UBE-RJ, e era bem incerto (e improvável para mim) estar na sigilosa lista de premiação da Olimpíada, segredo que eles guardam a sete chaves!
O que me passou pela cabeça foi o puxãozinho de orelha que recebi por ter ficado em terceiro lugar na mesma Olimpíada de Redação em 2011... e não ter comparecido à cerimônia. O pessoal da biblioteca havia ficado um pouco chateado com isso. (Olha aí, o meu desejo sendo realizado, queria mesmo ter ficado em terceiro lugar em 2009 - antes de descobrir que eu era o primeiro, claro. A verdade é que não queria abusar pedindo pelo primeiro lugar).
Em 2010 e 2012, compareci à cerimônia e não fui premiado, e confesso que não imaginava ser premiado em 2013, afinal, a Olimpíada já havia realizado tudo o que eu havia pedido em relação a ela! Ou não?
Em 2013, curiosamente, mudaram o regulamento e atenderam ao meu desejo lá de 2009: que todos os doze finalistas fossem premiados com dinheiro. E não é que eu fiquei em oitavo lugar? Nunca um oitavo lugar foi tão comemorado! Sorri, pois imaginei que realmente havia acertado em comparecer à cerimônia, pois o pessoal da biblioteca comemorou comigo e eu mais ainda com eles. 
Só que a surpresa não acabou aí...
Quando olho para o pacote de livros que os vencedores ganharam como parte do prêmio (além do dinheiro), o que vejo?
O meu livro "Palavras de Areia", premiado por quem? Pela União Brasileira dos Escritores - RJ! 
E pensar que há quatro anos eu estava a um passo de desistir... 
Há quatro anos, eu nunca poderia imaginar que um livro de minha autoria faria parte do próprio prêmio que me levou a continuar a acreditar no céu literário! 
Four!, como diria meu amigo Felipe, que sempre acreditou em meus sonhos e a quem dediquei o meu primeiro livro, em algum lugar do céu deve estar sorrindo - e não é que ele estava certo quando disse que eu seria feliz se viesse para Jundiaí?)


Obrigado a todos da Biblioteca Pública Municipal "Prof. Nelson Foot", que por meio da belíssima Olimpíada de Redação publica textos de crianças, jovens e adultos - quantos escritores estão sendo formados por ela! Obrigado à profª. Neizy, a todos da UBE-RJ, a toda minha família, amigos, aos sonhadores da CL... e a minha amada musa, a quem dediquei o texto vencedor daquela salvadora Olimpíada de 2009. 

PS: Em julho deste ano enviei o regulamento ao editor Rodrigo para publicação no blog Concursos Literários, ao qual tenho a honra de fazer parte da equipe. Se você tem o mesmo sonho que o meu, e está meio desanimado, tente participar dos concursos! Vamos compartilhar, para que mais pessoas possam ter a mesma oportunidade que eu tive, de conquistar alegrias literárias graças aos amigos que compartilhavam editais na CL. 
Por favor, se tiver conhecimento de algum concurso literário e quiser divulgá-lo, clique AQUI. Obrigado!

Anote o blog: www.concursos-literarios.blogspot.com.br 

Seja feliz! Abraços!

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Crônica do medo - texto vencedor do XII Prêmio FACCAT - Panorama (Categoria Crônica)



_ Você não teve medo?

          Essa foi uma das perguntas mais frequentes que me fizeram, quando voltei de minha viagem de volta ao mundo, passando por cinquenta países em oito meses. Depois, repetiram a mesma pergunta, quando voltei de outra viagem, desta vez, apenas pela América do Sul, só que realizada no estilo carona, dormir na praça e passar fome.
          Medo?
          Quase fui roubado e detido na Rússia, fui abandonado na fronteira tcheca, enganado no Peru, quase atropelado em uma ilha da Indonésia, quase despenquei de uma montanha na Venezuela, enfrentei uma enchente em Honduras, escalei um vulcão ativo na Guatemala, andei mil quilômetros na Espanha, fui ameaçado em Rondônia, dormi em caverna na Capadócia e em albergues de mendigos no Brasil, passei fome no Caminho da Fé, passei frio no Círculo Polar Ártico e calor na linha do Equador...
          Se eu tive medo?
          Sim. Eu tive medo. Tive medo de uma vida sem sentido, em trabalhar em um emprego em que acordasse com um suspiro de desânimo e retornasse para casa com outro de tédio. Tive medo de enfrentar o trânsito caótico de uma cidade para chegar a lugares em que eu não queria chegar. Tive medo de me enforcar com uma gravata todos os dias. Tive medo de abandonar o meu sonho de conhecer o mundo e de escrever sobre ele. Tive medo de viver cotidianos, de ver o mesmo dia se repetindo todas as semanas e todas as semanas se repetindo em todos os meses e todos os meses finalmente se convertendo em anos e os anos se convertendo em fim. Tive medo de adiar a minha vida.
          Por isso, eu parti. E em cada curva da estrada, em cada momento em que eu não sabia o que ia acontecer lá na frente, eu sorria. E nunca suspirei de tédio ou desânimo, mesmo diante de uma longa e escaldante estrada. Senti o frio ártico em minha pele e me senti mais aquecido do que nunca, pois é melhor sentir o frio na pele do que frio no coração. Senti o calor equatorial e suei todos as minhas frustrações, que se escondiam debaixo dos meus poros. Fui enganado, sim. Mas não perdi a confiança em mim. Fui abandonado, sim. Mas não abandonei a minha fé. Fui ameaçado, sim. Mas não ameacei desistir do meu sonho. Senti fome, sim. Mas nunca deixei de sentir a minha alma alimentada.
          Se eu não tenho medo agora?
          Tenho medo e sempre quero ter medo.
          Agradeço ao medo. Foi ele que me fez ter a coragem de enfrentar outros medos. A verdade é que não há medo maior do que não ter medo de nada. Pois o medo nos desafia a enfrentá-lo. Quem não sente medo, contenta-se com a segurança do cotidiano, dos pratos de mesmos sabores, dos bom-dias sem calor.
          Sinto medo de não ter medo. Medo de ter coragem de viver uma vida sem sobressaltos, sem riscos, sem desafios...
          Quero ter medo!

          Quero, sobretudo, ter medo da morte, para ter coragem de enfrentar... todos os medos da vida.







Obrigado aos organizadores deste belo prêmio, a todos da FACCAT e do Jornal Panorama. Vocês garantiram o pagamento da minha conta de luz para este ano e para o ano que vem inteiro! Se bem que medo de escuro eu não tenho... Mesmo assim, muito obrigado!!!